Destreinamento – Parte 1
O que acontece quando paramos de treinar por um período prolongado, seja de forma voluntária (férias ou como parte programada da programação do treinamento) ou involuntária (lesões)? Qual é o tempo necessário para descansar e qual é o limite de descanso? Quando e por que ocorre a perda de condicionamento físico? Vamos explorar o conceito de perda de condicionamento físico para ajudá-lo no entendimento do quanto é bom ou ruim a diminuição ou cessamento do treinamento. Essa primeira parte será sobre o impacto do destreinamento na força muscular.
Segundo Mujika & Padilla (2000), o princípio da reversibilidade do treinamento estabelece que o treinamento físico regular promove diversas adaptações fisiológicas que melhoram o desempenho atlético, enquanto a interrupção ou redução significativa do treinamento leva a uma reversão parcial ou total dessas adaptações, comprometendo o desempenho. Em outras palavras, o princípio da reversibilidade pode ser visto como o princípio do destreinamento. Atletas muitas vezes sofrem interrupções no processo de treinamento e competições devido a doenças, lesões, pausas na pós-temporada ou outros fatores, o que pode resultar em uma diminuição ou cessação da atividade física habitual. Portanto, é de extrema importância identificar os efeitos e entender os mecanismos associados a quaisquer alterações nas capacidades fisiológicas e no desempenho atlético.
Mujika & Padilla (2000) definiram o destreinamento como a perda parcial ou total das adaptações anatômicas, fisiológicas e de desempenho induzidas pelo treinamento, conforme uma consequência da redução ou cessação do treinamento.
Nas imagens subsequentes estão alguns exemplos que demonstram a diferença entre cessação e redução do treinamento.
Força Muscular
A produção de força muscular é um tema de grande interesse na área das ciências do esporte, devido à sua importância para a realização de diversas tarefas no dia-a-dia humano, bem como em atividades altamente especializadas, como no esporte de alto rendimento. Tanto os fatores neurais quanto os fatores morfológicos desempenham um papel crucial na produção de força muscular (Folland & Williams, 2007).
Os estudos sobre destreinamento na força e massa muscular são extremamente heterogêneos, ou seja, grande parte das pesquisas são realizadas com amostras diferentes (p.ex. iniciantes, jovens, idosos) e com protocolos de treinos bem variados. Além disso, outro ponto importante a ser destacado é a variação entre os estudos na avaliação da força (p. ex. exercícios com pesos livres x máquinas; força isométrica x força isotônica).
Dessa forma, nesse post estarei apresentando dois artigos sobre destreinamento, um com atletas e outro com destreinados.
O primeiro artigo que irei discutir foi publicado em 1993 pelo pesquisador Hortobagyl e colaboradores. Os pesquisadores analisaram 12 praticantes experientes (4 powerlifters / 8 ex jogadores de futebol americano) (idade:~24 anos; massa corporal: ~88kg; estatura:~181 cm) que cessaram o treinamento durante 14 dias.
Os resultados reportados pelos autores demonstraram que a cessação do treinamento durante 14 dias induziu pequenas diminuições no supino (-1.7%) e no agachamento (-0.9%).
Sendo assim, algumas considerações importantes precisam ser destacadas: (1) Não é comum que um atleta próximo de uma competição fique 2 semanas sem treinar e (2) Caso aconteça de você precisar viajar e por outros motivos não conseguir treinar, a força muscular sofrerá pequena alteração no curto prazo.
O outro é um elegante estudo publicado por Bickel et al., (2011), onde treinaram 39 jovens adultos sedentários durante 16 semanas e logo após randomizaram os voluntários em 3 situações distintas: destreinamento total; treinamento reduzido (1/3); treinamento reduzido (1/9) durante 32 semanas após às 16 semanas de treinamento.
Os resultados demonstram que quando comparado ao valor inicial (antes de começarem o programa de treinamento), todos os grupos continuaram com os valores de força superiores durante a fase de destreinamento ou redução do treinamento. No entanto, se analisarmos após a semana 16 (onde os ganhos de força já estavam mais estabilizados em decorrência da adaptação neural) o grupo que cessou o treino apresentou redução comparável ao do estudo anterior (Hortobagyl et al., 1993). Além disso, os autores reportaram que uma pequena manutenção 1/9 já foi suficiente para manter ou até mesmo aumentar a força após às 16 semanas inicias de treinamento.
Conclusões
Os estudos sobre o impacto do destreinamento na força muscular são extremamente heterogêneos em relação a metodologia de treinamento, amostra e avaliação da força muscular. A partir dos estudos supracitados (iniciantes x experientes) podemos concluir que cessar o treinamento irá impactar em reduções pequenas na força muscular (que podem ser prejudiciais para um atleta), mas que um pequeno volume de treinamento foi suficiente para manter a força muscular durante diversas semanas (em iniciantes).
Referências
BICKEL, C. S., J. M. CROSS, and M. M. BAMMAN. Exercise Dosing to Retain Resistance Training Adaptations in Young and Older Adults. Med. Sci. Sports Exerc., Vol. 43, No. 7, pp. 1177–1187, 2011.
Folland & Williams (2007) – Sports Med 2007; 37 (2): 145-168
HORTOBÁGYI, T., J. A. HOUMARD, J. R. STEVENSON, D. D. FRASER, R. A. JOHNS, and R. G. ISRAEL. The effects of detraining on power athletes. Med. Sci. Sports Exerc., Vol. 25, No. 8, pp. 929–935, 1993.
Hughes et al., (2018) – Cold Spring Harb Perspect Med 2018;8:a029769
Mujika I, Padilla S. Detraining: loss of training-induced physiological and performance adaptations. Part I: short term insufficient training stimulus. Sports Med. 2000 Aug;30(2):79-87.
Tibana, R. A. & Sousa, N.M.F. Fitness Functional Science. in press. 2023.
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